domingo, 23 de junho de 2013

CD - Capítulo 8

POV Estrela

– Ah, finalmente!

Logan suspirou, se jogando de volta na cadeira, enquanto ouvíamos os sons dos sapatos de Águas Claras sob a Lua contra o piso de madeira ficarem mais baixos à medida que ela se afastava e as últimas luzes do corredor se apagavam.


– Ora, você deveria ficar feliz por ela estar aqui, Logan – murmuro sarcasticamente, virando minha cabeça para ele – A Curandeira lhe dava motivos para voltar a ser um Buscador de verdade. Bem, pelo menos você fica cada vez melhor na dissimulação.

– Buscador de verdade? É assim que você me agradece, Estrelinha? – ele fazia um tom ofendido. Eu sabia que não era verdade, mas fiquei arrependida de qualquer modo.

– Tudo bem, me desculpe. Não quis dizer isso exatamente, É só que... Eu ainda não entendo o que você está fazendo. Quer dizer... Por que ainda não me entregou. Era... É, seu dever obter informações, e agora que você as tem, simplesmente não...

Calei-me abruptamente. O que eu estava fazendo? Tentando fazê-lo cair em si e contar tudo que sabia para outros Buscadores? Mordi a língua.

– Ah, oh... e-eu, hmmm, bem... eu n-não... – Logan engasgou. Respirou fundo e começou de novo – Suas olheiras estão ainda maiores hoje, Estrelinha. Descanse, eu vou ficar aqui até você dormir.

Eu resmunguei, mas tremi ao lembrar que ficar acordada só me faria ter mais constantes crises de enjôos. Ele puxou a cadeira para mais perto de minha cama, até estar apertado contra as beiradas de ferro.

– Boa noite, Logan – murmurei

– Boa noite, Estrelinha – ele afagava meus cabelos, quase não os tocando, então começou a sussurrar uma canção de ninar.

Eu soube quando ele dormiu, antes mesmo da sua música chegar ao segundo refrão; a mão ainda sobre minha cabeça, o rosto sobre o braço apoiado no colchão. Não podia vê-lo no escuro, apenas sua sombra, mas sua respiração mudou, ficando mais lenta e regular. Reconfortante.

Logan deveria estar exausto de verdade, fazendo-me perguntas o dia inteiro, toda vez que Águas Claras entrava na sala. Fingindo fazer o que realmente deveria estar fazendo, indagando e reclamando por minhas respostas falsas. Mas agora ele sabia por que eu não responderia. E eu era extremamente grata por isso – apesar de não fazer idéia, mesmo tendo uma leve e contínua desconfiança, de como um guardião da paz poderia mudar seus conceitos de uma hora para outra, por uma desconhecida.

Suspirei; minha cabeça girava, mas não tanto quanto meu estômago; se bem que isso não era nenhuma novidade.

Eu deveria tentar dormir. Eu deveria estar exausta também, mas o sono simplesmente não vinha. Então virei minha cabeça para a parede, apertando os olhos e respirando fundo.

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“Jamie, jogue direito!”, resmungo.

Mas tudo que ele faz é rir e passar a bola para Mel, Ian se deixa driblar, e ela faz mais um gol para nosso time de duas.

“Incrível, realmente fascinante. Um Stryder e um O’Shea perderem pra duas garotas. Nunca achei que você descesse tão fundo, Ian”, Mel reclama, mas ela sabe o que eles realmente fizeram.

“Foi sorte, Melanie, apenas isso” murmura Jamie com um sorriso maroto.

Eu reviro os olhos.

“Sorte, sim. Mas só se eu fosse estúpida. Não é de hoje que Ian nos engambela com esse truquezinho.”

“Como se fossemos insuficientes para vencermos sozinha!” exclama Melanie, exasperada “Não jogo mais com vocês dois, não desse jeito.”

Ian ri, pegando a bola e a girando nas mãos.

“Ian disse que isso se chama cavalheirismo” Jamie declara, dando de ombros.

“Eu digo que se chama roubo contrário. Vocês estão se deixando perder para nós ganharmos, e isso só pode ser idiotice. Eu sei jogar, a Melanie também. ENTÃO DEIXEM-NOS JOGAR DIREITO!”

“Ai, Peg, não precisa berrar”, Ian diz, se aproximando de mim. Eu cruzo os braços e viro para o outro lado. “Tudo bem, querida. Deixamos vocês perderem dessa vez. Mas só dessa vez”

Ouço Melanie dar um bufo debochado.

‘Gostaria de saber por que vocês não me deixam jogar como todo mundo. Você sabe que eu jogo bem”, reclamo

Ele sorri, e beija minha testa

‘Nós apenas não queremos que você se machuque, meu amor. Nós não queremos que algo aconteça a você’

“Privar-me de jogar bola não vai resolver isso”

“Fazer você se cansar, cair e ficar cheia de hematomas, tampouco”, ele devolve, o tom bravo e avesso à ideia.

“Da próxima vez, eu jogo com você, então”, digo, ficando na ponta dos pés e encostando os lábios nos seus, “Ficaremos juntos, e então você não vai ter desculpa alguma para vencermos injustamente”

“Ou perderem de lavada!”, grita Jamie do outro lado do salão, e nós rimos quando Mel criou um grito de guerra para o time dos irmãos Stryder.

“Está bem então”, Ian sussurra, “Ficaremos juntos da próxima vez. Sempre.”

Ele me abraça, e eu deixo escapar um suspiro de prazer. E sei que é aqui que eu quero ficar para o resto da minha vida humana, dentro daquele lugar, dentro daquele abraço. Mesmo que eu ganhe todas as partidas de futebol do mundo.

Algo dentro de mim grita, e eu sei que estou tentando abrir os olhos. Mas eu não consigo. Exatamente como no primeiro dia, as lembranças suprimindo o meu ser.

“Nunca me cansaria de ficar observando-o. Nunca.

Sua face brilhava, sua voz se elevava em constante alegria. Ele estava cada dia maior, cada dia mais bonito. A criança das lembranças de Mel não existia mais. Agora Jamie era um homem, tomando suas próprias decisões e seus próprios caminhos; para a maioria das coisas, ele era tão forte e independente quanto qualquer outro agora. Aquilo sempre tinha sido visível. Mas meu Jamie nunca tinha parecido tão vivo e intenso quanto naquele momento, numa simples conversa alegre com uma bonita garota da célula de Nate. Os sorrisos dos dois eram tão imensos que era impossível não sorrir também.

“Ele está crescendo não é?”, murmura Mel ao meu lado, inconscientemente.

“Para mim, ele já está enorme”, respondo, ‘Não há mais para crescer nele.”

“Você sabe que não foi o que eu quis dizer”, ela resmunga, depois aponta para Jamie, “Olhe o que está acontecendo, Peg. Meu garotinho sumiu. Minha pobre criança agora não precisa mais de mim.”

“Sabe que ele sempre vai precisar de você, Mel”, eu sorrio para ela, tentando desfazer sua cara mista de raiva, incompreensão e um pouco de felicidade, “É o Jamie. Sempre será uma criança para nós.”

“Sim, mas agora ele não gosta de ser tratado como tal, muito mais do que antes. Ontem mesmo eu fui colocá-lo para dormir, e disse que ficaria ao seu lado se estivesse muito escuro. E o que ele fez? Praticamente gritou comigo que não era mais um bebê, e que não precisava mais de ninguém para ninar o sono dele.”, Ela respirou fundo, de olhos fechados, “Dá para acreditar nisso?”

“Humanos são assim mesmo. Um dia eles crescem, e o que antes era o conforto, passa a ser quase desonrador.” Suspiro, desviando meu olhar dele para Melanie. “Mas você não esperava que ele fosse o mesmo, não é? Depois de tudo isso, todos nós fomos obrigados a crescer para evitar mais dores. Principalmente Jamie não seria exceção.”

Ela retesa os músculos, como para segurar as más lembranças no mesmo cantinho escondido que ela evitava; por fim, soltou a respiração, e seus olhos brilhavam também, com lágrimas.

“Espero que ele seja feliz com isso, então.”, é o que ela diz.

Então voltamos nossa atenção para o garoto sorridente e tagarela na nossa frente, suspirando as duas ao vê-lo gargalhar com a garota, os dois perfeitamente alegres. Eu fito o brilho ofuscante no seu olhar espevitado e desejo sempre poder ver Jamie assim.

Sinto meu estômago girar. Eu preciso acordar, algo está rasgando minha garganta, queimando. Mas tem alguma coisa pesando sobre minhas pálpebras, e eu não consigo abri-las.

“Como eu me lembro de ter dito algo assim tempos atrás... Isso não é tão emocionante quanto antes’ Kyle diz, gesticulando e olhando impacientemente através da janela do furgão.

‘Bom, sentimos não estarmos proporcionando a emoção do perigo para você, irmãozinho.”, Ian brada, “Mas talvez você seria mais feliz se estivesse sozinho por aí, sem ninguém para colocar os olhos na frente dos seus.”

“Não quero dizer que sinto falta de correr perigo”, Kyle revira os olhos, “É claro que não. Só estou dizendo que era bom ter alguma adrenalina correndo nas veias. Agora é simplesmente rodear as ruas, comprar as coisas, colocar no carro e ir embora.”

“E isso não está bom o bastante para você?”

“É, tá. Mas de qualquer jeito, sinto falta dos velhos tempos”, Kyle deixa um suspiro pesado sair, então começa a bater os dedos ritmadamente no painel do carro, apreensivo enquanto procuramos um canto discreto no estacionamento do supermercado para eles me esperarem.

“Falta dos velhos tempos!”, Ian resmunga baixinho.

Eu olho para cima, admirando o céu azul, lembrando-me de que eu conhecia cada segredo que havia na imensidão além dele. Lembrando-me de quando eu voava por ele, de planeta em planeta, convivendo com meus irmãos e com minha imortalidade. E eu não sinto falta disso. Nem por um segundo. Porque sei que não há lugar no universo que tenha o que eu tenho aqui. Eu não sinto falta do passado - eu vivo sempre no presente, pensando no futuro - apreciando cada segundo com a única coisa de que eu tinha consciência agora. E é apenas aqui que eu quero viver para sempre.

Eu me ergui da cama com tanta força que o mesmo deu um solavanco. Minha respiração sai em arfadas, como se eu estivesse de baixo d’água por minutos. Eu olho para o lado para ver se eu não tinha acordado Logan, mas ele continuava dormindo na mesma posição, murmurando eu seu sono.

Minha cabeça está rodando, e minha blusa está colada no corpo pelo suor, assim como meu cabelo está grudado no meu rosto.

Eu tento puxá-lo para trás, para me livrar do calor insuportável que me deixa sem ar; mas o simples movimento dos braços me traz uma onda de náusea no estômago e minha garganta se fecha, obrigadando-me a me arquear e apertar a mão contra boca até que eu consiga alcançar uma vasilha do lado da cama – eu ponho tudo para fora.

Enquanto meu jantar vai embora com veemência, eu me faço a pergunta inconscientemente.

Quem me impõe essas memórias? Quem me obriga a vê-las toda vez que eu fecho os olhos? Sim, porque nenhum hospedeiro sonha por livre vontade se suprimido, e eu tinha a completa certeza de que a consciência desse era agora inexistente.

Como quando Peregrina habitava dentro de Melanie, a hospedeira que a fez chegar aos humanos a partir de memórias de sua vida com seu irmão e o seu amor; a hospedeira resistente que Peregrina amava mais do que tudo. Mas essa é a diferença – Melanie resistira, sua mente não fora apagada, ela podia fazer com que Peregrina visse o que ela queria.

Mas não há meios desse corpo fazer o mesmo, já que não há mais ninguém aqui. Então, a menos que eu queira me lembrar, como esses sonhos que retornam ao passado me invadem nítidos e reais?

Eu acredito na minha resposta para isso.

Peregrina, a Alma humana que rejeitou a sua espécie para viver com os hospedeiros da Terra, com seu amor avassalador, que residia dentro do corpo que agora sou eu, conseguiu mudar os próprios fundamentos dessa hospedeira.

Ela transformou, com toda a intensidade singular daquela Alma, esse hospedeiro dela. Mesmo que ela não esteja aqui, esse corpo é ela. Todos os pensamentos e hábitos dessa humana sem consciência são inteiramente herdados de Peregrina.

E, portanto, apenas por ser ela, não havia meios de existir longe do apoio que a segurava neste planeta. Ela não podia ficar longe da sua casa, dos seus humanos, da sua vida - uma necessidade essencial, as suas sombras vivas de felicidade. Esse corpo implorava por isso, ultrapassando todas as impossibilidades de fazê-lo sozinho.

Eu jogo água no meu rosto, me lavando numa tentativa inútil de me refrescar.

Não há mais nada para fazer hoje, exceto tentar voltar a dormir, e tentar de todas as maneiras possíveis não sonhar. Mas agora não adiantava mais; algo na minha cabeça gritava e se repuxava, tentando me fazer ver a única solução para as múltiplas dores contínuas dentro de mim.

Então eu volto para cama, e assim como as lágrimas nos meus olhos, uma nova ideia ardia na minha mente.

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