quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

DA - Capítulo 7

~ 07~

Robert

Eu encarei os documentos à minha frente uma vez mais, pensado em como eu conseguiria encontrar uma secretária substituta para Rosalie. Ela era tão eficiente!

Melinda Antonieta Calle. Americana, vinte e quatro anos, solteira, formada em Ciências Contábeis há dois anos, funcionária da R Blackwell Corporation há um ano e meio. Filha de pais desconhecidos, cresceu no orfanato Raio de Sol, de onde fugiu aos dezessete anos...

Orfanato Raio de Sol!...

Eu já havia notado o quão familiar me parecia aquele nome, mas foi apenas quando avancei mais algumas páginas do dossiê sobre Melinda Calle, que percebi o quanto o destino estava sendo sensato ao fazer com que Melinda e eu nos “esbarrássemos”. Aquele orfanato era o mesmo ao qual eu havia feito uma doação bem mais que generosa há alguns anos atrás. Não que eu fosse algum filantropo, longe disso, no entanto, minha mãe o era.

Ainda consigo me lembrar perfeitamente bem de como os olhos de Alexandra brilhavam de felicidade a cada vez que ela ajudava a alguém que necessitava. Acho que Elizabeth herdou isso dela, no fim das contas.

Mas o fato é que: quando consegui juntar meus primeiros milhões, pouco tempo depois de ter terminado a faculdade, eu decidi fazer com uma parte desse dinheiro o que minha mãe teria feito se ainda estivesse viva: caridade.

Foi assim que, há alguns anos, o orfanato Raio de Sol recebeu esse tão sonhado regalo e, se minhas contas estiverem certas, nessa época, Melinda ainda não havia fugido, o que significava que ela foi uma das pessoas beneficiadas com minha doação.

Eu não me considerava a pessoa mais justa do mundo, mas ao menos eu sabia reconhecer o mérito de outras pessoas e, se aquelas crianças realmente queriam agradecer a alguém, esse alguém se chamava Alexandra Blackwell. Nesse caso, Melinda não estaria sendo usada por mim, certo? Ela apenas estaria me ajudando a preservar a memória de minha mãe, como forma de agradecer-lhe pela ajuda de alguns anos atrás. Não era pedir muito, era?

***

Uma vez mais, lancei um olhar para o prédio deprimente onde Melinda vivia, perguntando-me o porquê de ela precisar viver em um lugar tão... deplorável. Meu staff não ganhava assim tão mal, ganhava?

Com um suspiro cansado, adentrei o pequeno prédio, notando que não havia absolutamente ninguém na recepção. Utilizando-me das informações contidas no dossiê que Rosalie preparara, subi dois lances de escadas, e rapidamente encontrei o apartamento de Melinda.

Bom, ao menos havia campainha! — pensei ironicamente.

Verifiquei meu relógio de pulso, notando que graças a minha ansiedade, acabei chegando com quinze minutos de antecedência. Sendo assim, provavelmente Melinda ainda estaria em meio a uma pilha de roupas, indecisa sobre o que vestir. Afinal, mulheres são sempre mulheres: indecisas e nada pontuais!

Olhando para as roupas que eu usava, imaginei a qual tipo de lugar ela estaria planejando ir. Quer dizer... não se pode ir a muitos lugares requintados quando se está vestindo um jeans escuro e uma camisa salmão dobrada até os cotovelos.

Observar a mim mesmo me fez pensar no que Melinda possivelmente escolheria para vestir, uma vez que ela mesma escolheu o estilo nada formal que eu estava utilizando esta noite.

Mais uma olhadela no relógio.

Não haviam se passado nem mesmo cinco minutos, e eu já estava ficando impaciente. O que estava acontecendo comigo, afinal? Por que eu não estava conseguindo me controlar? Isso poderia fazer dessa noite um fiasco, e eu não precisava acrescentar mais itens à minha lista de problemas. Ao menos não quando eu estava tentando impedir Paige e seus filhos bastardos de colocarem suas mãos imundas na herança de Frederick.

Respirei fundo algumas vezes, tentando colocar meus pensamentos em ordem. Foi quando percebi uma movimentação vinda do apartamento de Melinda.

Ela abriu a porta ao mesmo tempo em que tentava tirar suas chaves da fechadura, demorou cerca de uns três segundos para ela perceber que não estava sozinha no corredor.

Seus olhos negros se arregalaram ao pousarem sobre mim, e ela retrocedeu um passo, estacando em sua posição. Ela parecia surpresa em me ver ali — talvez por minhas roupas, ou pelo simples fato de eu estar perfeitamente parado à porta de seu apartamento. Contudo, ela não estava mais surpresa do que eu estava.

De uma forma completamente inexplicável, ela parecia... diferente e exatamente igual! Era confuso, e eu não pude impedir meus olhos de inspecioná-la, desde suas sapatilhas pretas, passando por suas pernas cobertas com um jeans quase negro e seu torso vestido numa camisa azul clara. Seus lábios estavam róseos, mas num tom natural, e os cabelos negros estavam livres, descendo por seus ombros, costas e quase roçando seus quadris fartos.

— Olá — eu murmurei encarando-a, fazendo com que ela piscasse seus olhos de cílios longos algumas vezes, meio aturdida. — Espero não ter chegado cedo demais!

— Não — apressou-se em negar. — Eu já estava descendo para esperá-lo, de qualquer forma.

— Então... vamos? — convidei com um meneio de cabeça, indicando as escadas.

— Claro — concordou prontamente, atravessando o portal e guiando seu molho de chaves até a fechadura da porta.

— Sem bolsa? — eu inquiri curiosamente.

Desde quando mulheres iam a qualquer lugar sem carregar seus apetrechos de beleza?

— Sem bolsa — anuiu. — Tenho tudo o que preciso espalhado nos bolsos do meu jeans — continuou enquanto deslizava suas chaves para dentro do bolso de trás de sua calça.

— Nesse caso... guie-me, senhorita. Você está no comando esta noite — disse-lhe sugestivamente, num meio sorriso.

Melinda acenou uma vez com a cabeça, parecendo desconcertada, enquanto mordia seu lábio inferior nervosamente.

***

— Então esse é o lugar! — comentei assim que nós nos sentamos numa pequena mesa de madeira barata, após uma garçonete sorridente nos entregar o cardápio.

— Espero que não se importe — Melinda falou franzindo as sobrancelhas. — Nós podemos ir embora, se você quiser... eu sei cozinhar, posso preparar alguma coisa...

— Você sabe cozinhar? — inquiri ironicamente, interrompendo-a.

— Contanto que não seja algo muito elaborado — ela deu de ombros. — Sim, eu sei...

Eu sorri para ela, realmente surpreso com a revelação.

— Eu não me importo em ficar — disse-lhe honestamente.

Seria uma experiência interessante, no mínimo... para não dizer inusitada.

— Vocês já decidiram o que vão comer? — a garçonete inquiriu de volta à nossa mesa.

Eu não precisava olhá-la para saber que, provavelmente, ela tentaria flertar comigo — isso se já não o estivesse fazendo — então, decidi continuar olhando para Melinda, esperando que ela não escolhesse nada indigesto para comermos.

— Você quer fazer isso? — perguntou-me arqueando as sobrancelhas.

— Não... eu confio em você! — assegurei-lhe.

Sem olhar para o cardápio, ela se dirigiu à garçonete, fazendo o pedido.

— Uma pizza grande de lombinho de porco, por favor... com milho e azeitonas extras!

Lombinho de porco? Eu não comeria aquilo, comeria?

— E para beber? — a garçonete inquiriu numa voz entediada.

— Coca-cola, por favor.

— Você não vai querer nada, bonitão? — insistiu a garçonete.

— Nada que eu já não tenha — respondi sem tirar os olhos de Melinda.

De uma forma surpreendente, eu a vi corar e levar seu olhar para longe do meu, fazendo-me soltar um riso incrédulo.

— Ela não vai desistir assim, tão facilmente! — alertou-me quando a garçonete já havia se retirado.

— Bom, ela precisa compreender que eu já tenho companhia...

Melinda pigarreou, corando violentamente.

— Eu não queria deixá-la constrangida — disse-lhe como uma forma de me desculpar.

— Eu sei — ela concordou num sorriso tímido.

— Por que você não me fala um pouco de como foi o seu dia? — sugeri dando de ombros, esperando que assim ela se sentisse à vontade o bastante para falar, afinal, eu precisava inspirar-lhe confiança.

— Não aconteceu nada extraordinário, se é o que quer saber. Nenhum carro me atropelou, pelo menos! — brincou.

Então ela tinha senso de humor? — murmurei para mim mesmo num sorriso.

— Você não foi ao escritório, hoje... — observei, esperando que ela começasse a tagarelar.

— Era meu dia de folga, então eu simplesmente passei um tempo com minha família.

— Família? — inquiri unindo minhas sobrancelhas.

Desde quando ela tinha uma família?... Isso não estava nos meus planos, e muito menos no dossiê que Rosalie preparara. Será possível que minha estimada secretária estivesse perdendo o tato?

— Bem, na verdade... eles não são minha família biológica — retificou-se. — Eu os conheci há alguns anos, mas... a senhora González defende a tese de que todo latino-americano vivendo num país estrangeiro pertence à mesma família — ela deu de ombros, com um sorriso divertido brincando em seus lábios.

— Você é latina? — Droga, Rosalie! Por que você teve que deixar tantas lacunas nas informações a respeito de Melinda Calle?

— Isso é o que Javier e Eva acham.

— Quem?

— Eva é o primeiro nome da senhora Gonzáles — explicou. — E Javier é neto dela. Eles acham que eu sou latina porque... — Melinda parou, olhando-me sem jamais encarar meus olhos, enquanto mordia seu lábio, como se estivesse incerta sobre o que iria dizer. — Bom, por uma série de motivos — decidiu-se por fim.

— Então você é americana — constatei.

— Até que se prove o contrário, sim — assentiu.

— Mas com uma clara ascendência latina — concedi.

— Acho que isso não é algo contestável — ela disse num sorriso singelo.

— Seria bem mais fácil se você simplesmente perguntasse aos seus pais, não acha? — pressionei.

— Eu não os conheço — murmurou levando seu olhar em direção a suas mãos entrelaçadas sobre a mesa.

— Não? — inquiri franzindo o cenho, colocando em meu rosto minha melhor expressão de desentendido.

Ótimo! Aquele era o momento em que ela me contaria sua triste história de vida, e nós estreitaríamos laços. Ela choraria compulsivamente por horas, eu lhe ofereceria um ombro para chorar, iria consolá-la com alguns beijos, e então, com um pouco de sorte, talvez eu conseguisse convencê-la a me acompanhar até um lugar mais... confortável.

— Eu não quero falar sobre isso — Melinda sussurrou indo contra todas as minhas expectativas.

— Tudo bem — concordei a contragosto. — Se você não se sente confortável para falar sobre isso, eu entendo.

Melinda apenas acenou levemente com a cabeça, com um pequeno sorriso em seus lábios.

— E quanto ao senhor... — ela apertou os lábios, franzindo o cenho em desgosto enquanto eu lhe lançava meu olhar “já conversamos sobre isso antes”. — Você — enfatizou. — Suponho que tenha passado um tempo com sua família, também.

Eu sorri com disfarçado escárnio, afinal, eu não considerava as breves visitas à casa de Elizabeth como um tempo dedicado à família. Minhas visitas eram sempre rápidas e bem objetivas, o que não deixava muito tempo para todo o sentimentalismo que Elizabeth guardava.

— Na verdade eu fiquei no escritório durante todo o dia.

— Sério? — Melinda testou duvidosamente, estreitando seus olhos escuros em minha direção. Eu apenas confirmei com um aceno de cabeça. — Mas por quê?... Quer dizer... há uma porção de coisas para se fazer do lado de fora do escritório.

— Dentro dele também — murmurei em observação, enquanto a garçonete retornava à nossa mesa, depositando nossos pedidos de forma ruidosa. Dessa vez eu me permiti olhá-la, já que Melinda e eu havíamos nos silenciado no intuito de não compartilhar nossa conversa com mais ninguém.

O fato é que a garçonete não estava nada contente. Parecia estar realmente aborrecida com algo, e observei enquanto ela lançava um olhar pouco amigável na direção de Melinda que, ao perceber, desviou seus olhos, fitando o prato à sua frente.

Um sorriso irônico se apossou de meus lábios enquanto eu imaginava o que a garçonete poderia estar pensando daquela cena.

— Você não está com a mínima vontade de comer isso, está? — Melinda inquiriu alguns segundos mais tarde depois de estarmos servidos, apontando para o meu prato.

— Acho que esse é o momento em que admito jamais ter comido algo assim, antes! — digo-lhe por fim.

— Olha, nós podemos tentar alguma outra coisa...

— Não, tudo bem! — eu a interrompi. — A aparência não está ruim, se quer mesmo saber — apontei.

Sem adiar mais o momento, levei uma garfada da massa até a boca, mastigando-a cautelosamente. Melinda me olhava com ar curioso, esperando pacientemente que eu engolisse a porção que acabara de levar à boca.

— E então?... Muito ruim? — quis saber.

— Bem... — eu ponderei falsamente por um momento, vendo sua expressão agora ansiosa, enquanto ela aguardava por uma resposta. — Isso tem um sabor incrível! — admiti.

Ela pareceu relaxar em sua posição, cortando um pedaço de sua massa logo em seguida e levando-o à boca.

— Você faz isso sempre? — instiguei. — Quero dizer: dirigir até algum lugar informal e ignorar qualquer coisa que pareça saudável.

— Quanto a parte de dirigir, posso assegurar-lhe que não — contestou. — Mas eu gosto de comer coisas não tão saudáveis, às vezes.

— Você não sabe dirigir?

— Sim, eu sei... mas não tenho carro! — ela deu de ombros, naturalmente, deixando-me ainda mais intrigado.

— Por que não?

— Digamos que eu tenha muitas contas a pagar.

— Eu pensei que fosse generoso com os salários de todos na empresa.

— Definitivamente — anuiu após bebericar um gole de refrigerante. — Generoso até demais.

— Eu apenas tento compensar a todos — disse-lhe. — Cada membro do staff é muito importante para o funcionamento da empresa. Então, eu pensei: se eles participam do trabalho árduo, por que não deixá-los participar dos lucros? — esclareci-lhe num sorriso, vendo-a acompanhar meu gesto.

— Isso é muito generoso da sua parte — opinou gentilmente.

— Manter uma empresa do porte da R Blackwell Corporation não é fácil — apontei.

— Acho que você não deve conhecer as palavrinhas com “F”, certo?

— Palavrinhas com “F”? — repeti sem compreender.

— É... folga, feriados e férias — comentou com um sorriso singelo e divertido.

— Apenas na teoria — admiti sorrindo-lhe de volta.

— Talvez você precise de um tempo para si mesmo! — opinou distraidamente. — Trabalhar tanto assim não faz bem à saúde e, além do mais, de que adianta juntar tanto dinheiro se você não pretende gastá-lo?

— O quê? — eu testei, aturdido.

Melinda realmente havia dito aquelas coisas para mim? Ela estava mesmo falando sério?

Observei enquanto seus olhos se arregalavam. Provavelmente, ela nem mesmo se deu conta do que acabara dizer. Contudo, o entendimento parecia atravessar seu olhar nesse exato momento.

— Você acabou de me chamar de workaholic, ou é impressão minha? — instiguei.

— Não exatamente... quer dizer... mil perdões, eu não quis ofendê-lo... eu só...

— Você não me ofendeu — murmurei, surpreendendo a mim mesmo ao constatar o quanto aquelas palavras eram verídicas.

— De qualquer forma, eu não deveria ter dito essas coisas — falou rapidamente, com as maçãs de seu rosto rubras de constrangimento. — Mas eu... eu só...

— Melinda... — eu a chamei.

— O senhor ainda é meu chefe... — prosseguiu ignorando meu chamado. — Eu precisava ter tomado mais cuidado com o que dizia... eu sabia que esse jantar seria uma péssima ideia. Na verdade...

— Não! — cortei-a firmemente, fazendo-a fitar-me num movimento abrupto e desnorteado. — Não é o senhor Blackwell quem está aqui, e sim Robert... apenas Robert! — eu a lembrei. — Além do mais, você tem razão — concedi enquanto molhava meus lábios com um gole do líquido gaseificado à minha frente. — Vamos deixar Robert Workaholic Blackwell — zombei — trancafiado em seu escritório, e falar sobre qualquer outra coisa que não seja trabalho!

Lançando um sorriso em direção a Melinda, percebi quando sua expressão se aliviou um pouco mais, e então ela acenou levemente com a cabeça uma vez, obviamente concordando com minha proposta.

***

— O que foi? — inquiri a Melinda assim que terminamos nossa refeição.

Ela parecia relutante em querer ir embora, o que poderia ser um bom sinal.

— Bem... você disse que eu tinha algo de que precisava — ela me lembrou. — No entanto, nós falamos de tudo, menos do assunto que mais lhe interessava...

— A noite ainda não acabou — ponderei em voz alta. — Se você aceitar caminhar comigo, nós ainda podemos falar, o que acha?

— Caminhar — ela repetiu a palavra, testando-a, e logo em seguida me fitou com um pouco mais de atenção. — Ouça, se você estiver precisando de algum documento, ou mesmo um dado em específico, eu posso muito bem...

— Melinda, não é nada relacionado à empresa — esclareci. — Na verdade, é de caráter pessoal — disse-lhe seriamente.

Ela uniu as sobrancelhas, visivelmente confusa, mas aceitou minha oferta.

Após pagar a conta e pegar um casaco dentro do carro para Melinda, nós caminhamos calmamente em direção a uma pracinha ali perto.

— O que esse “L” significa? — perguntei-lhe curiosamente apontando para o pingente de seu colar, logo após ter colocado o gasalho sobre seus ombros.

Ainda que minimamente, senti o corpo de Melinda estremecer quando meus dedos esbarraram em seus ombros cobertos por sua camisa de mangas compridas.

— “L” de “Linda” — murmurou. — Meus amigos me chamam assim.

— Entendi — sussurrei-lhe de volta, num falso ressentimento. — É íntimo demais para que seu chefe possa utilizá-lo.

Ela sorriu levemente, olhando-me de soslaio enquanto continuávamos caminhando.

— Pode me chamar de Linda, se preferir... talvez, dessa forma, não soe tão estranho chamá-lo de você, ou mesmo de Robert.

— Esse vai ser nosso pequeno segredo, ou também posso chamá-la assim quando estivermos no escritório, Linda? — instiguei uma vez mais.

— Você é o chefe — apontou. — Não precisa do meu consentimento para algo assim.

Eu parei de caminhar abruptamente, puxando-a de modo que seu corpo esbarrasse no meu.

Aquele era o momento certo de agir, eu tinha plena certeza.

Ela não era indiferente a mim, eu já podia afirmar isso antes, mas agora que seus olhos estavam tão perto dos meus, eu conseguia ver a surpresa neles.

— Pela milésima vez, Linda — sussurrei a centímetros de seus lábios. — Pare de me ver como seu chefe...

— M-mas... — ela gaguejou iniciando um protesto.

— Sem ‘mas’ — apressei-me em silenciá-la. — Eu quero que você me veja como homem... só isso. É o que eu quero... — eu ponderei a respeito daquela frase, constatando que ela não saíra suficientemente boa para mim. — É o que eu preciso, na verdade!

Os olhos de Linda estavam surpresos, e minha ânsia por finalmente obtê-la fez-me trazer seu corpo para mais junto do meu, prendendo-a entre meus braços e esmagando seus lábios com os meus.

Lábios muito macios, eu pude constatar, e que deveriam ser ótimos executando um beijo de verdade, algo que fosse mais além de um simples tocar de lábios. Como que por reflexo, eu apertei a cintura de Linda com um de meus braços, enquanto elevava o outro para segurar sua nuca e trazê-la para mais perto de mim, no entanto, eu não tive tanto êxito.

Ainda pude sentir a maciez dos longos cabelos negros de Linda, mas então ela começou a agitar-se em meus braços, empurrando-me para longe dela. Aturdido, eu quebrei o contato de nossos lábios, enquanto ela me empurrava para longe com um pouco mais de afinco e cambaleava para trás.

— O que você fez? — exigiu saber, aparentemente desnorteada.

— Beijei você? — contestei numa interrogativa.

— Isso não deveria ter acontecido — alertou-me com olhos marejados.

— Por que não? — quis saber.

— Porque eu não sou como nenhuma das suas... amigas! — retorquiu.

— Eu sei disso, Linda! Jamais disse o contrário! Você não é superficial, controladora, mesquinha... e é por isso que eu preciso de você. Eu preciso...

— Precisa esquecer o que acaba de acontecer, porque sou diferente de suas amigas em mais sentidos do que você pode imaginar!

— Como? — inquiri ainda sem compreender.

— Não estou aberta para amizades com benefícios — murmurou tristemente. — Eu não vou ser usada por uma noite para então você se esquecer até mesmo do meu nome!

— Linda, eu não irei usá-la por uma noite...

— Tem razão — interrompeu-me. — Você não vai, porque estou indo embora nesse exato momento.

Num movimento rápido, Linda retirou meu casaco de sobre seus ombros, e o depositou desajeitadamente sobre meus braços.

Droga! Como as coisas poderiam ficar assim, tão complicadas? Eu não posso ter sido precipitado, não faz sentido! Essa nem é a primeira vez que saímos!

Ela começou a se afastar, aparentemente trêmula e em choque.

— Linda, espere! — pedi indo de encontro a ela. — Eu a levo em casa, não é seguro que você vá sozinha!

— Não! — protestou veementemente, virando-se para me encarar. — Eu vou para casa sozinha, não preciso da sua ajuda! Só me deixe em paz, por favor!

— Mas Linda...

— Por favor! — ela insistiu num olhar de súplica.

Eu não precisei responder, afinal, ela me deu as costas e se foi, caminhando apressadamente pela rua, deixando-me ali, de pé, sozinho e com um sorriso enorme nos lábios.

Como alguém consegue ser assim, tão imprevisível?

Ela realmente me rejeitou? Porque isso, definitivamente, não estava previsto para acontecer.

Aparentemente, conquistar mulheres como Melinda Calle era muito mais difícil, o que só poderia significar que a recompensa era inenarravelmente maior.

O meu tempo para conseguir uma esposa era curto, e Melinda fazia o tipo difícil. A coisa mais sensata a se fazer, era ir em busca de outra garota... alguém que não fosse tão geniosa. Contudo, agora, mais do que nunca, eu queria Melinda Calle. Sua rejeição atiçou algo dentro de mim; um desejo insano de fazê-la se render às minhas vontades e torná-la minha esposa.

— Você será minha, Linda — murmurei para mim mesmo. — E quando nos beijarmos da próxima vez, você vai preferir a morte por asfixia a ter que deixar meus lábios para tomar ar.

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